Elon Musk aceitou bloquear contas no X na Turquia e na Índia e no Brasil, não; entenda

A batalha jurídica entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e a rede social X e seu dono, o bilionário Elon Musk, teve como ápice a derrubada da plataforma no Brasil desde as primeiras horas do último sábado (31).

De um lado, o STF determinou que a empresa nomeasse um representante legal no Brasil e que acatasse a uma série de ordens relativas ao bloqueio de conteúdo e usuários. Do outro, Musk vem se recusando a acatar as ordens e acusa o judiciário brasileiro de ser uma ameaça à democracia.

Musk vem repetindo que sua determinação em não cumprir as ordens do STF fazem parte de sua defesa à liberdade de expressão. Por outro lado, o ministro Alexandre de Moraes, responsável pela ordem que suspendeu o X no Brasil, argumenta que “Elon Musk confunde liberdade de expressão com uma inexistente liberdade de agressão”.

Mas disputas envolvendo ordens para bloqueio de conteúdo não são novidade para o X e nem para Musk, mas pelo menos dois casos semelhantes tiveram desfechos bastante diferentes. Na Índia e na Turquia, por exemplo, autoridades determinaram a derrubada de perfis e conteúdo considerado inapropriado e, apesar de uma resistência inicial, o X acabou cumprindo as determinações.

O fato de o desfecho nestes países ter sido diferente, embora a situação fosse parecida levou à questão: por que Musk acatou ordens na Turquia e na Índia, mas faz questão de descumpri-las no Brasil?

Especialistas em mídia, direito e democracia argumentam que Musk adota esta postura no Brasil por uma conjunção de fatores, entre eles, o apoio que ele tem por parte da direita brasileira, especialmente aquela que orbita em torno do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Eles argumentam que essa proximidade cria condições para que Musk desafie o STF na medida em que oferece suporte político para essa postura.

Os especialistas apontam ainda que, apesar de Musk se colocar como defensor do direito à liberdade de expressão, na prática, ele concilia essa suposta bandeira com seus interesses econômicos ao ponto de não hesitar em manter negócios bilionários com países considerados por eles como autoritários, a exemplo da China e da Arábia Saudita.

Em 2021, antes de Musk comprar a plataforma, o então Twitter iniciou uma batalha legal com o governo indiano liderada pelo primeiro-ministro Narendra Modi. Em meio ao embate, a polícia indiana chegou a dar uma batida em escritórios da empresa no país.

No centro dessa disputa estavam as demandas do governo indiano para que o Twitter bloqueasse uma série de perfis vinculados a protestos massivos de fazendeiros contra o governo de Modi.

Em 2022, ainda antes da compra da plataforma por Musk, o Twitter deu início a uma ação contra as demandas do governo indiano para a remoção de perfis e conteúdo sob o argumento de que eles representavam uma ameaça à “ordem pública”.

Na época, a então direção do Twitter contra-argumentou afirmando que alguns dos pedidos para bloqueio de contas e remoção de conteúdo violavam direitos básicos como a liberdade de expressão.

Em fevereiro de 2024, porém, após a compra do Twitter por Musk, a plataforma acatou às decisões do governo indiano e admitiu ter bloqueado uma série de contas ligadas a manifestantes contrários ao governo.

Nos últimos meses, especulou-se a possibilidade de que Musk poderia fazer um investimento bilionário para a construção de uma mega-fábrica de baterias da Tesla, sua empresa de carros elétricos na Índia.

Turquia

Em maio de 2023, já sob o comando de Musk, o X e Elon Musk foram criticados por ter acatado as determinações do governo turco, liderado por Recep Tayyip Erdogan, para derrubar contas e postagens de personalidades ligadas à oposição no país.

Em nota, divulgada na época, o X admitiu que cumpriria as ordens.

“Em resposta a um processo legal e para assegurar que o Twitter permanece disponível para as pessoas na Turquia, nós tomamos medidas para restringir o acesso a algum conteúdo na Turquia hoje”, disse uma nota da equipe de Assuntos Globais do X, na época.

“Hipocrisia”

Para especialistas em mídia e relações internacionais, o argumento de Musk para descumprir as ordens do STF no Brasil ao ponto de levar à derrubada da plataforma no País não se sustenta. Segundo eles, Musk estaria sendo “hipócrita” e agiria baseado em interesses políticos e econômicos.

“É hipocrisia Musk afirmar que desafia as ordens do STF por defender a liberdade de expressão, mas acatar ordens semelhantes em outros países. Além disso, como pode um defensor tão ferrenho da liberdade de expressão simplesmente silenciar sobre o fato de o X não ser permitido em países como a China, onde ele tem negócios?”, disse o especialista em antropologia da tecnologia, David Nemer.

Segundo ele, Musk só teria “esticado a corda” no Brasil por contar com apoio de parte expressiva da direita brasileira.

“Ele tem o apoio de figuras importantes da direita brasileira como o ex-presidente Jair Bolsonaro, e muitos outros parlamentares que, agora, estão criticando a decisão. Esse suporte político dá a ele a liberdade de contestar as ordens do Supremo no Brasil e, ao mesmo tempo, ajuda a desgastar a credibilidade da instituição no país”, disse Nemer.

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