Pedestres e passageiros são as maiores vítimas do fim do DPVAT, afirma especialista

Fique de olho no trânsito. Sempre. Qualquer descuido e lá se vai a vida de alguém ou acontece alguma invalidez para o resto da vida. É bem isso. Sem dó nem piedade. Principalmente para os mais simples, as pessoas com menos recursos. Este é o resultado do fim do Danos Pessoais para Veículos Automotores Terrestres, conhecido por DPVAT, que existia desde 19 de dezembro de 1974, 50 anos atrás, e que garantia a indenização de vítimas de acidentes de trânsito.

Aprovado pelo Congresso no dia 18 de dezembro, depois de poucas discussões, o fim do seguro mostra que há pouco interesse dos políticos e de grande parte da sociedade com a população mais pobre. É o que avalia o especialista em trânsito Rodolfo Rizzotto.

Autor de vários livros e com um site que lida com questões específicas do setor, ele entende que esta votação, quase unânime (444 votos a favor e só 16 contra), mostra que esta elite não hesitou em virar as costas para os que não têm veículos e são as maiores vítimas do trânsito brasileiro: pedestres e passageiros, especialmente os mais desprotegidos financeiramente.

Para Rodolfo, carioca, com pai gaúcho e mãe da Letônia, essas vítimas já sofrem com a impunidade no trânsito e, agora, foram definitivamente abandonadas. “Terão de chorar seus mortos e cuidar dos inválidos sem nenhum suporte financeiro. O único seguro social do país, que por longo tempo garantiu um mínimo de dignidade a essas famílias, foi definitivamente enterrado.”

Para ele, a extinção do DPVAT, em 2020, e do seu natimorto SPVAT, é um retrocesso inacreditável, extinguindo um conceito revolucionário para proteger as vítimas mais vulneráveis. O fim desta proteção às vítimas das ruas e estradas se resume à economia de algumas dezenas de milhões de reais por ano.

“As vítimas do trânsito — desprotegidas e invisibilizadas — seguirão sem amparo. Muitos desses algozes ainda dirigirão alcoolizados, amparados pela impunidade que nem qualquer Lei Seca consegue combater integralmente”, afirma Rodolfo.

Nestes seis dias que antecedem o Natal, segundo o especialista, estima-se que pelo menos 600 pessoas morrerão no trânsito brasileiro e outras 3.600 ficarão com sequelas. A maioria delas pessoas simples, sem recursos e que herdarão apenas a dor. Um exemplo disso é o acidente ocorrido entre três veículos deixando 42 mortos e vários feridos no sábado (21), na altura do km 285 da BR-116, em Lajinha, distrito de Teófilo Otoni, Minas Gerais. Acidente foi cheio de irregularidades, principalmente de um caminhão carregado de pedras de granito. Os outros dois veículos eram um ônibus de passageiros e um carro particular.

Dinheiro

O DPVAT foi extinto em 2020, no governo Jair Bolsonaro. O dinheiro que estava acumulado no fundo que administrava os recursos foi usado para pagar as indenizações até novembro de 2023. Desde então, o pagamento para as vítimas está suspenso. Em outubro do ano passado, o governo apresentou o Projeto de Lei Complementar 233/2023, que recriava o fundo de indenização, que passava a se chamar Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT). No entanto, a volta do DPVAT foi derrubada na Câmara dos Deputados. 

Agora, a Câmara aprovou a revogação da lei que instituiu o Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT), o antigo DPVAT. O texto agora segue para o Senado. Se a proposta for confirmada pelos senadores e sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), não haverá a volta da cobrança. 

Ao todo, 21 estados – entre eles São Paulo – e o Distrito Federal tinham definido que não cobrariam o SPVAT (antigo DPVAT). A lei, porém, determinava que o pagamento do valor é obrigatório e a não quitação impedia licenciar o veículo. Ou seja: a recusa dos gestores estaduais teve apenas efeito político.

Mortes

As estatísticas disponíveis no sistema de Dados Abertos da Polícia Rodoviária Federal indicam aumento de 176 mortes em 2023 em relação a 2022 e 5.337 feridos. No ano passado, foram 166.623 acidentes, 59.418 feridos leves, 18.890 feridos graves e 5.615 mortes. Não estão computados aí os mortos em acidentes em rodovias estaduais e de motoqueiros. 


Acidente neste sábado (21) deixou 38 mortos e 13 feridos na BR-116, na altura do km 286, em Lajinha (MG) / Foto: Bombeiros MG

Conforme o Detran, o Rio Grande do Sul registrou queda no número de mortes no trânsito em 2023. Foram 1.572 vítimas fatais em acidentes de trânsito no ano passado contra 1.707 em 2022, o que representa uma redução de 8%. O número de vítimas fatais engloba as pessoas que morreram no momento do acidente bem como as mortes de feridos em até 30 dias após o ocorrido.

Ideias simples

Rizzoto, que coordena também o SOS Estradas, programa nacional que visa reduzir os acidentes e aumentar a segurança nas rodovias do Brasil, com a participação de usuários e especialistas em trânsito, medicina, transporte e rodovias, diz que a situação é alarmante na área. Cita também condições de rodovias, investimentos precários em segurança e vigilância, falta de sinalização e irresponsabilidade de alguns. Também diz que a carga horária de profissionais caminhoneiros por exigências de empresas transportadoras contribui igualmente para a elevação de acidentes.

“Nosso objetivo é alertar através do SOS as autoridades sobre os problemas nas estradas e seus usuários. Com ideias simples poderemos reduzir os acidentes, principalmente nesta época de Natal e Ano Novo, quando há deslocamentos em massa de pessoas pelas estradas brasileiras”, explica.


 
 

 

 

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