‘Vai poupar muita gente de tratamentos desnecessários’, diz médico do RS sobre uso de IA contra o câncer de mama


Protocolo pesquisado no Reino Unido detecta células tumorais no exame de sangue com ajuda da inteligência artificial. Especialistas do RS apostam na inovação para promover a saúde das mulheres. Um simples exame de sangue, analisado por inteligência artificial, acende um alerta à equipe médica: este paciente terá câncer no futuro. A partir da notificação, uma série de procedimentos é iniciada, e a pessoa aumenta sua expectativa de vida, dispensando sessões de radioterapia e quimioterapia.
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Esse protocolo está em testes, e com precisão acima de 80%, como comprovou um estudo publicado na revista científica britânica The Lancet.
O mastologista Antônio Luiz Frasson, do RS, é um entusiasta da inovação, e elenca a IA como “a área mais interessante da oncologia”.
“É o maior desafio e o grande projeto. Eu espero que chegue logo e não acho que vai demorar muito para acontecer, porque é um foco de pesquisa muito importante nos últimos anos. Isso vai poupar muita gente de tratamentos desnecessários”.
A tecnologia tem capacidade de avaliar o DNA de células tumorais que circulam no sangue, segundo o especialista. O estudo divulgado no Reino Unido, chamado OncoSeek (na tradução, “busca oncológica”), teve 10 mil participantes.
Para avaliar os exames desse público, foi aplicado um algoritmo treinado para encontrar células cancerígenas não visíveis pelos métodos atuais de diagnóstico, como radiografias e rastreamento genético.
“Hoje, se trata praticamente todo mundo do mesmo jeito. Porque, na dúvida, sem saber se tem célula circulando ou não, a gente prefere tratar baseado em fatores de risco. Isso vai mudar no momento em que nós tivermos um teste, validado, que identifique muito antes do que clinicamente, e antes que a paciente tenha dor”, complementa o mastologista.
Frasson é oncologista no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, e também coordena a oncologia do Hospital Nora Teixeira, em Porto Alegre. Na capital paulista, a inteligência artificial já é usada para auxiliar em radiografias – tecnologia que, segundo ele, deve vir para a capital gaúcha nos próximos meses.
“O software é um suporte, ele alerta pra algum ponto que pode não ter chamado atenção do radiologista. E quando se lauda uma mamografia, se faz uma dupla leitura. Dois radiologistas examinam a mamografia. Nós estamos utilizando muito a inteligência artificial como uma primeira leitura também, e ela elenca aquele exame como prioridade se algo estiver alterado”, explica.
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Rastreamento genético
Uma opção já em uso para identificar tumores hereditários é o rastreamento genético, também realizado por exame de sangue.
“A presença de uma alteração genética não é uma certeza de que a pessoa vai ter câncer. Mas vamos imaginar uma mulher da população geral. O risco de ela ter câncer de mama é em torno de 10%. Pra quem tem as alterações genéticas de maior risco, essa chance de câncer de mama vai pra 80%, 90% ao longo da vida”, alerta a médica geneticista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Patricia Ashton-Prolla.
A médica é diretora científica da Rede Brasileira de Câncer Hereditário, e defende que aplicar o teste em uma grande parcela da população geraria, no futuro, uma economia ao Sistema Único de Saúde.
“Tem estudos bem recentes dos Estados Unidos e do Canadá, onde eles estão considerando fazer o teste em todas as mulheres da população aos 30 anos de idade. Eles viram que é mais barato testar todas e encaminhar aquelas que têm um risco maior para um programa de prevenção específico, e aquelas que não têm um risco maior seguem com as recomendações da população. Isso vai fazer com que a gente consiga, eventualmente, reduzir a ocorrência de câncer, o que também é uma economia”, complementa.
Patrícia pondera que estender o rastreamento genético exigirá investimento em uma rede ampla de atendimento.
“Não adianta somente a gente ter o teste, a gente precisa garantir que as mulheres que têm alterações genéticas vão conseguir fazer o acompanhamento por toda a vida, que vai incluir às vezes cirurgias, às vezes exames mais precisos do que a gente oferece hoje”, finaliza.
“A Flor que Nasceu na Careca”
A terapeuta Melissa Portal, de 38 anos, descobriu um câncer de mama em 2016. Uma herança genética, já que ela perdeu a avó e a mãe para a mesma doença.
“Quando era pequena, eu tinha a sensação que eu falava com a minha mãe no espelho. E era como se ela me preparasse pra algo. Eu sentia que eu ia ter, por isso que eu sempre me cuidei. Tanto que quando eu tive, foi uma confirmação”.
Em casa, o assunto sempre foi um tabu. “Era ‘aquela’ doença, não se nominava o câncer”, lembra a moradora de São Leopoldo, no Vale do Sinos. Por isso, Mel buscou, desde a adolescência, se informar sobre como o estilo de vida pode ajudar, sobre os avanços na medicina e também se concentrou na forma de conversar com a filha Luísa, hoje com 8 anos, caso fosse diagnosticada.
“Sempre falei com ela como se fosse qualquer assunto. Como se fosse uma doença tratável, porque a mãe dela trata, todos esses anos. E que é possível, que o amor pode curar, e que a gente tem que ter muita fé e acreditar no Papai do Céu”.
Para ajudar outras famílias a tratarem do tema, ela lançou um e-book, “A Flor Que Nasceu na Careca”.
“Uma coleguinha dela me chamou, e disse, ‘Tia Mel, por que tu é calva?’ Fiquei pensando, ‘meu Deus, como é que eu vou explicar isso pra criança?’ Levantei a touca, e disse, ‘Tia Mel bota uma terra pra adubar aqui. Pra depois plantar uma florzinha, regada com muito amor nessa terra”.
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