Em audiência antes de ser solto, Nego Di culpou sócio e falou de vida de luxo após suposto golpe de R$ 5 milhões; veja vídeos


Sessão foi realizada em outubro, um mês antes da soltura do humorista. Nego Di é réu por estelionato e lavagem de dinheiro em esquema de produtos não entregues por loja virtual. Segundo investigação, 370 pessoas foram lesadas. Nego Di: ‘Eu só quero pagar as pessoas e resolver a minha vida’
O g1 e a RBS TV obtiveram acesso ao interrogatório de Nego Di, na audiência de instrução do processo em que ele é réu por estelionato e lavagem de dinheiro em um suposto esquema de produtos não entregues aos clientes de uma loja virtual. A sessão ocorreu no dia 18 de outubro.
No depoimento, Dilson Alves da Silva Neto deu sua versão sobre o caso, afirmando ter sido vítima do sócio, Anderson Boneti. Os dois são réus pelo golpe que teria lesado 370 clientes, causando um prejuízo estimado em R$ 5 milhões, segundo as investigações.
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Vídeos da audiência de outubro mostram os argumentos de Nego Di diante das perguntas da juíza Patricia Pereira Krebs Tonet e do Ministério Público (MP).
“Eu só quero pagar as pessoas e resolver a minha vida”, disse.
Na ocasião, o humorista ainda disse que era “uma bosta estar preso”. Nego Di foi solto em 27 de novembro. Naquela data, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), concedeu liberdade provisória a Nego Di até o julgamento do mérito de habeas corpus pedido pela defesa no processo.
“Desde que me conheço por gente, sei que eu sou um cara negro e que eu tenho que pisar em ovos para não apanhar da polícia e não ser preso. Para mim, desculpa o termo, mas é uma merda, é uma bosta estar preso”, disse.
Nego Di fala sobre período na cadeia: ‘É uma bosta estar preso’
Nego Di também foi indagado sobre a vida de luxo que mantinha enquanto clientes pediam ressarcimento dos produtos não entregues pela loja. O influenciador ainda respondeu sobre publicações em que, de acordo com a polícia e o MP, ele aparecia debochando das pessoas que teriam sido lesadas. Veja detalhes abaixo.
Procurado, o Ministério Público afirmou que “não vai se manifestar durante processo em andamento”.
O g1 entrou em contato com a advogada de Nego Di, Camila Kersch, mas ela não se posicionou até a atualização mais recente desta reportagem.
A advogada Daniela Couto, que atuou na defesa de Anderson Boneti na audiência de instrução, também foi contatada, mas não respondeu até a atualização mais recente desta reportagem.
Nego Di durante depoimento à Justiça, ainda preso, em outubro de 2024
Reprodução
Relação com o sócio
O interrogatório de Nego Di durou cerca de 1h30. Nesse período, o humorista relatou como conheceu Anderson Boneti. Eles foram sócios na loja virtual “Tadizuera”. Segundo o Ministério Público, eles seriam responsáveis por um esquema que vendia produtos com preços abaixo dos praticados pelo mercado e não entregavam os itens aos clientes.
Segundo as investigações, Nego Di e Anderson teriam lesado mais de 370 pessoas com vendas pelo site entre 18 de março e 26 de julho de 2022. A Polícia Civil afirma que o influenciador usaria a própria imagem para aumentar o alcance dos anúncios pela internet – com abrangência nacional, o que fez com que houvesse supostas vítimas até de fora do RS.
No interrogatório, Nego Di disse que firmou um acordo com Anderson em que eles dividiriam os lucros da loja em 50% para cada um. Mais tarde, questionado pela juíza, o humorista disse que não obteve renda com as vendas.
Juíza: Qual era a sua renda mensal dessas vendas?
Nego Di: Com as vendas, absolutamente nada.
Juíza: O senhor não estranhou, já que o senhor disse que o combinado era dividir os lucros?
Nego Di: Sim.
Nego Di contou que os primeiros relatos de atraso nas entregas dos produtos surgiram nas redes sociais. O influenciador responsabilizou Anderson e disse que o sócio dava “desculpas” sobre os problemas da loja, culpando uma transportadora pelos supostos atrasos.
“Quando começaram os atrasos, ele me deu várias desculpas, disse que era a transportadora”, disse Nego Di.
Anderson Boneti e Nego Di, réus por estelionato e lavagem de dinheiro
Reprodução
Em um dos casos apurados pela polícia, um cliente de Pelotas disse ter feito um empréstimo de R$ 30 mil para comprar 33 aparelhos de ar condicionado da loja virtual para revendê-los. Os preços variavam de R$ 799,90 a R$ 1.199 – abaixo do de mercado. O homem, que prefere não ser identificado, nunca recebeu os produtos.
“Nos perfis dele [em redes sociais], a gente via que ele debochava do caso, aproveitava a vida com o nosso dinheiro. Viajando para fora, Punta Cana… O que aconteceu [a prisão] dá esperança de que a gente pode ser ressarcido”, disse o cliente.
Ao longo de quatro meses, entre julho e novembro de 2022, o cliente tentou contato com Nego Di pelo WhatsApp. Sem obter o ressarcimento, o homem procurou a polícia e registrou um boletim de ocorrência.
Nego Di é preso por golpe que causou prejuízo de R$ 5 milhões a clientes
Vida de luxo e clientes sem ressarcimento
Enquanto dizia buscar meios de ressarcir os clientes, o influenciador admitiu ter mantido despesas elevadas, como a compra de carros de luxo e o aluguel de um imóvel por R$ 14 mil mensais em uma praia de Florianópolis, onde ele foi preso em julho.
Juíza: Quanto custava o aluguel da casa, se o senhor não se importar de falar?
Nego Di: Não, não tem problema de falar. O aluguel custava 14 mil, na época.
Segundo Nego Di, o valor teria sido negociado com o proprietário. O influenciador diz ter feito um adiantamento para reduzir o preço do aluguel.
Em depoimento, Nego Di fala de imóvel alugado por ele em Santa Catarina
O influenciador ainda relatou o episódio da compra de um Porsche. A juíza então perguntou como ele adquiria carros de luxo, mesmo dizendo passar por problemas financeiros.
“Bem no começo do negócio, quando o senhor disse que estava mal, o senhor tinha um Porsche, e aí, por defeito, deram BMW no lugar?”, indagou Patricia Pereira Krebs Tonet.
A juíza também perguntou sobre a melhora das condições de vida do influenciador, com uma renda mensal que chegava a R$ 500 mil, enquanto os clientes reclamavam dos produtos não entregues.
O Ministério Público apresentou um vídeo em que Nego Di aparece em um podcast ironizando a vida de ostentação, com viagens para o exterior. No programa, o humorista diz: “Vou aplicar essas milhas e vou viver de renda. Quando desandar a maionese e acabar o dinheiro, aí eu vou voltar assim: ‘Gente, quem nunca errou, né? Quem nunca errou? Fui enganado junto com vocês'”.
Questionado se, no vídeo, fazia referência aos problemas da loja virtual, Nego Di disse que a fala era anterior aos fatos investigados e que estava brincando.
Representante do MP: O senhor lembra de ter participado desse programa?
Nego Di: Claro que lembro, doutora. Mas isso está nítido que é uma piada, uma brincadeira.
Em meio às investigações, a polícia analisou vídeos em que o humorista usaria de deboche para se referir aos clientes lesados. Em um deles, Nego Di aparece “brincando em relação as pessoas que não receberam os bens, enquanto se desloca em carro de luxo, uma Mercedes branca, conversível, chegando em seu restaurante”, disse o delegado Cristiano Reschke.
Nego Di ainda citou uma conversa com um antigo advogado, em que teria manifestado o interesse de ressarcir os clientes.
“Eu quero dar um jeito de pagar, porque assim, isso é um fantasma na minha vida. A senhora [juíza] não tem noção da dimensão do quanto isso é [inaudível]. O lógico é eu estar preso, mas na época eu fiquei meses sem sair de dentro de casa, sem ir no mercado, sem ir em shopping. Até um tempo atrás, na rua, eu deixei de frequentar lugares porque as pessoas me olhavam e eu ficava pensando, ‘será que essa pessoa é minha fã, me reconheceu, não gosta de mim, que não comprou um ar'”, disse.
A juíza ainda questionou se, quando Nego Di obtinha milhares de reais em contratos de patrocínio, ele procurou ressarcir os clientes da loja.
Juíza: Eu tenho no inquérito que, em algum momento, o senhor teve uma melhora bem significativa de padrão de vida, inclusive a sua defesa informa nos autos, que de janeiro a julho, o senhor recebia, acho que mais de meio milhão de reais por mês em patrocínio, o senhor confirma?
Nego Di: É, não, em alguns meses eu cheguei a receber isso, mas eu tiro como base o patrocínio da [cita o nome de uma empresa], que era R$ 250 mil, e os outros eram publicidades avulsas, pró-labore.
Juíza: E mesmo assim, em algum momento o senhor buscou essas vítimas para pagar?
Nego Di: Sempre busquei, doutora.
Nego Di durante depoimento à Justiça, ainda preso, em outubro de 2024
Reprodução
‘Estornos estratégicos’
Em uma gravação de áudio obtida pelo g1 em julho deste ano, Nego Di mencionou “estornos estratégicos” para “acabar com manifestação e incômodos”. Segundo a polícia, ele estaria se referindo à insatisfação dos clientes que não teriam recebido produtos que adquiriram da loja virtual “Tadizuera”. Na gravação, o influencer pede uma lista com clientes que, se fossem ressarcidos, dariam “uma boa amenizada”.
Questionado sobre esse mesmo áudio na audiência, Nego Di afirmou que os “estornos estratégicos” seriam direcionados a pessoas que estariam protestando ou o ameaçando em razão dos problemas da loja virtual.
“Primeiro, eu queria pagar as pessoas que me ofereciam o risco da vida de todos nós. Esse era um dos estornos estratégicos. Eu queria pagar as pessoas de pouco valor, de pouco valor, para pagar o máximo de pessoas que eu conseguisse. Por que, por exemplo, a maioria das pessoas foi assim, R$ 599, R$ 799”, relatou à juíza.
Nego Di ainda disse que vendeu um Porsche por cerca de R$ 150 mil para fazer os pagamentos.
Juíza: Sobre um áudio que também veiculou nas redes sociais, e acho que integra o processo, sobre estornos estratégicos, o que o senhor queria dizer com aquilo?
Nego Di: A gente não tinha muito dinheiro quando eu comecei a estornar as pessoas. A primeira atitude que eu tive foi vender a Porsche, porque bloquearam as contas. O pouco de dinheiro que eu tinha, tinha R$ 36 mil, alguma coisa assim, que estava bloqueada até hoje, então eu só tinha a Porsche, não tinha mais nada na minha vida. A Porsche, na época, foi R$ 200 mil, mas eu consegui vender por muito menos, porque já era pública a situação. Eu vendi para revenda.
Em áudio antes da prisão, Nego Di citou ‘estornos estratégicos’
Próximos passos do processo
Nego Di agora aguarda o julgamento do habeas corpus na Justiça do Rio Grande do Sul. Em liberdade provisória, o influenciador foi advertido por ter aparecido em vídeos nas redes sociais após sair da prisão. Nas imagens gravadas e publicadas por uma de suas advogadas, o humorista aparece em uma roda de samba durante um churrasco. A advogada foi demitida da defesa de Nego Di após o episódio.
O sócio, Anderson Boneti, pediu liberdade nos mesmos termos da decisão do STJ que autorizou a soltura de Nego Di. A juíza Patricia Pereira Krebs Tonet negou o pedido, dizendo que o réu está preso por outro processo, em que é acusado do desvio de R$ 30 milhões de uma empresa. O caso não tem relação com a ação envolvendo a loja virtual e Nego Di.
Nego Di é solto após quatro meses na penitenciária de Canoas
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