A Privatização do DMAE: Melo quer deixar Porto Alegre com sede

O ano novo mal havia iniciado e o prefeito Sebastião Melo enviou para a Câmara Municipal um pacote de Projetos de Lei, apelidado pela oposição e movimentos sociais como “pacote de maldades”, que prevê a extinção da FASC e alterações na Lei nº 2312/1961, responsável pela criação do Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE).

Entre as mudanças propostas, destaca-se a transformação do Conselho Deliberativo da autarquia, composto por técnicos e especialistas, em um Conselho Consultivo, que apenas será informado das decisões. O fato de esses projetos terem sido apresentados em uma sessão extraordinária no início de janeiro, em meio às férias e sem qualquer debate com a população, demonstra o caráter antipopular e antidemocrático do governo, evidenciando que tudo isso faz parte de um plano para entregar o DMAE nas mãos dos empresários.

A água potável e o tratamento de esgoto são necessidades básicas e essenciais para a saúde pública. São direitos fundamentais garantidos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. Privatizar um serviço tão vital coloca o acesso à água e ao saneamento sob o domínio do mercado, o que pode elevar as tarifas devido a uma gestão voltada para o lucro, e não para o bem-estar da população. As empresas privadas, ao contrário do que acontece no setor público, têm como objetivo principal maximizar lucros e, em muitos casos, priorizar clientes mais rentáveis, em detrimento dos mais vulneráveis. 

Neste sentido, uma das consequências imediatas da privatização do DMAE é o risco de aumento nas tarifas de água e esgoto, em especial para a população mais pobre. Experiências como a venda da CEDAE no Rio de Janeiro, em que a tarifa social subiu o dobro da inflação provam este argumento. Campo Grande (MS) também teve sua água privatizada e como resultado lidera o preço entre todas as capitais brasileiras. Em Ouro Preto (MG) a elevação da tarifa após a privatização teve um salto de R$ 22 e R$ 26 passando para tarifas que variam entre R$ 300 e R$ 1.400. Essa é a lógica do mercado, que visa aumentar os lucros das empresas às custas da sede do povo.

Ao contrário de uma empresa privada, que tem como objetivo o lucro, o DMAE é um órgão público cuja principal missão é assegurar que todos os cidadãos, independentemente de sua classe social, tenham acesso a serviços essenciais com tarifas justas e adequadas à sua renda. Embora seja uma autarquia pública financeiramente saudável, com mais de R$ 400 milhões em caixa em 2023, todo superávit gerado deveria ser reinvestido na manutenção e ampliação dos serviços prestados. No entanto, as administrações de Marchezan e Melo retiraram a autonomia administrativa, econômica e financeira do Departamento, comprometendo sua capacidade de investir, adquirir insumos e equipamentos, e repor o quadro de servidores. O objetivo sempre foi sucatear para vender.

Outro grande risco da privatização do DMAE é a probabilidade de precarização dos serviços. As empresas privadas tendem a priorizar a redução de custos operacionais, o que pode resultar em menos investimentos em infraestrutura e na qualidade do atendimento. A venda do DMAE para iniciativa privada pode resultar em demissões dos trabalhadores ou na terceirização de funções, enfraquecendo a capacidade operacional do serviço e comprometendo a qualidade no atendimento à população.

A proposta também impede o controle social e o exercício da democracia. O DMAE, sendo uma entidade pública, está sujeito a controles e fiscalizações mais transparentes, como audiências públicas e participação popular em decisões sobre tarifas e investimentos. Com a privatização, o controle social se torna mais difícil, uma vez que as decisões passam a ser tomadas por uma empresa privada, cujo único interesse é o lucro.

Não bastassem os argumentos já apresentados, acrescento que privatizar a água coloca Porto Alegre na contramão do mundo. Nos últimos anos, vários países reestatizaram os serviços de água, revertendo a privatização e buscando resgatar o controle público sobre esse recurso vital. Cidades como Paris na França, Berlim na Alemanha e Atlanta nos Estados Unidos municipalizaram os seus serviços com objetivo de garantir tarifas mais justas e acessíveis, além de promover a universalização do acesso à água potável e ao saneamento, com foco no bem-estar social. 

Diante destes aspectos, afirmo: privatização não é uma solução para os desafios do saneamento em Porto Alegre; pelo contrário, ela pode gerar mais problemas. O DMAE deve permanecer sob controle público, sendo gerido com eficiência, responsabilidade e compromisso. Precisamos seguir mobilizados para garantir que Melo não lucre com a sede da população! 

* Erick Dênil, vereador do PCdoB de Porto Alegre, presidente da Comissão de Defesa do Consumidor, Direitos Humanos e Segurança Urbana (Cedecondh).

** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.


Adicionar aos favoritos o Link permanente.