Especial Artistas Gaúchas: Clarissa Ferreira

As mulheres têm conquistado um espaço de autonomia dentro de territórios onde antes eram silenciadas. Suas produções artísticas são cada vez mais relevantes. Nesta série, apresentamos artistas gaúchas que, ao mesmo tempo que têm perpetuado as tradições do Rio Grande do Sul, têm feito uma revolução na história.

Seu nome é Clarissa Ferreira, tem 37 anos e é violinista, compositora, doutora em Etnomusicologia. É atualmente professora do curso de Música da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Clarissa foi inserida nas artes através da dança: fez ballet clássico dos 7 aos 16 anos, atividade que atualmente voltou a praticar. “A dança é algo muito especial para mim”, relata.

Na música, ela começou estudando violino em sua cidade natal, Bagé (RS), fazendo aula no Instituto Municipal de Belas Artes, mesmo local onde ensaiava o ballet. Aos 16 anos, partiu para Pelotas para cursar bacharelado em violino. Ali, começou também a trabalhar profissionalmente com a música e decidiu então conciliar uma carreira acadêmica com a vida de instrumentista. Então, cursou mestrado e doutorado na Etnomusicologia, em Porto Alegre e Rio de Janeiro, respectivamente. 

Quando perguntada como é ser mulher no meio tradicionalista, Clarissa reponde que “toda experiência é única para cada mulher”. Para ela, sua vivência durante o tempo que atuou tocando em musicais de invernada artística de Centro de Tradições Gaúchas (CTG) teve coisas boas, pois foi um universo de trabalho muito importante que se abriu. Porém, ela também se deparou com um ambiente que ainda não conhecia, em face de “um machismo muito escancarado”, com piadas misóginas e homofóbicas.

Mais tarde ela iniciou sua pesquisa sobre esse ideal da prenda, de submissão e feminilidade e a partir daí foram ficando mais evidentes suas incomodações.

Durante aproximadamente 10 anos, ela participou do movimento dos festivais nativistas, sendo uma das poucas instrumentistas nesse meio.


“Ainda vamos demorar muito para conquistar a liberdade que deveríamos ter em nossas produções artísticas e espaços de trabalho enquanto esse tipo de feminismo (neoliberal) estiver figurando” / @vitoriaproenca

“Feminismo de convenção”

“Comecei a refletir sobre isso, a estudar, ler, e escrever. Peitei sozinha durante muito tempo a questão do machismo, abordando as temáticas machistas nas letras, festivais que proíbem a presença feminina e a ausência de mulheres compositoras nesse meio. Quando comecei a peitar e pautar isso fui criticada por algumas mulheres que depois até se apropriaram do meu discurso, usando-o em prol de si e não do movimento de todas. Acho que de toda essa esfera complexa da presença das mulheres nos ambientes da cultura gaúcha, é importante ressaltar a influência de um feminismo de convenção, que também podemos chamar como neoliberal, onde se veste a camiseta do feminismo, mas não em prol de todas as mulheres”, relata.

Clarissa aponta como o movimento da “música regional gaúcha” continua mantendo a configuração de ter uma ou algumas poucas mulheres como representantes. Como se isso resolvesse a questão do machismo. Sem falar o que se produz ainda nessa esfera que, para fazer parte desse movimento, acaba sendo a reiteração dos mesmos estereótipos de homem e mulher e as mesmas temáticas, que somente concordem com essa normativa, pois “o movimento não comporta nem suporta o debate”.

“Ainda vamos demorar muito para conquistar o espaço e principalmente a liberdade que deveríamos ter em nossas produções artísticas e espaços de trabalho enquanto esse tipo de feminismo estiver figurando”, completa.

A artista tem uma relação especial com o Uruguai, onde desde 2016 vai a um encontro de músicos que acontece em La Serena, organizado pelos compositores Dani e Jorge Drexler. “Esse lugar serviu como uma escola para mim. Foi lá que, ao conviver com muitos cantautores e cantautoras de toda América Latina, despertou em mim um desejo muito forte para a composição, para cantar e tocar violão. Acredito que essa integração é muito responsável por quem sou hoje artisticamente.”

Projetos

Agora, Clarissa pretende seguir desenvolvendo esses projetos de pesquisa e musicais aos quais tem se dedicado e também à docência que é meu grande foco.

“Tenho planos de seguir gravando mais trabalhos autorais de canção, solo e com a minha dupla com Ana Matielo. Também seguir os trabalhos com o quarteto de cordas que montei, a Sucinta Orquestra que atualmente desenvolve projeto com uma lenda na música gaúcha que é o Gilberto Monteiro, autor de clássicos como Milonga para as Missões.”

Na parte da pesquisa, continua empenhada e tem planos de lançar outros livros no futuro. Também almeja lançar um trabalho instrumental em algum momento. Os trabalhos da artista podem ser acompanhados pem seu Instagram.


 
 

 

 

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