Entenda a operação que levou ao afastamento de cinco desembargadores suspeitos de venda de sentenças

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou nesta semana uma operação da Polícia Federal (PF) e afastou cinco desembargadores de Mato Grosso do Sul por suspeita de venda de sentenças judiciais. No mesmo dia, os magistrados viraram alvos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que deve abrir procedimento administrativo para avaliar a conduta dos envolvidos.

O STJ, em decisão do ministro Francisco Falcão, autorizou 44 mandados de busca e apreensão, com o objetivo de apurar possíveis crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa, extorsão e falsificação de escrituras públicas no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.

A partir da decisão, foram afastados os desembargadores Sérgio Fernandes Martins, presidente do tribunal; Vladimir Abreu da Silva; Alexandre Aguiar Bastos; Sideni Soncini Pimentel; e Marco José de Brito Rodrigues. Procurados, eles não se manifestaram.

O corregedor-geral de Justiça, ministro Mauro Campbell, solicitou ao STJ o compartilhamento das provas da operação realizada pela PF. O objetivo é abrir um processo no CNJ. De acordo com o órgão de correição do Judiciário, “caso sejam identificados indícios de irregularidade, serão adotadas as medidas necessárias à preservação dos jurisdicionados do Mato Grosso do Sul”.

A PF aponta que os desembargadores suspeitos de envolvimento no esquema usavam escritórios de filhos advogados para negociar decisões judiciais. Para a polícia, “a intenção era burlar os mecanismos de rastreamento do fluxo de dinheiro”. Outros artifícios chegaram a ser usados, segundo a PF, como venda de gado para esconder a origem ilícita dos recursos.

A PF achou ainda R$ 2,7 milhões em dinheiro vivo na casa do desembargador aposentado Júlio Roberto Siqueira Cardoso.

O magistrado, que se aposentou em junho deste ano, também foi alvo de mandado de busca e apreensão. O Ministério Público Federal (MPF) chegou a pedir a prisão dele, mas o STJ não aceitou. Procurado, Cardoso não falou sobre as acusações.

A PF teve aval para quebrar o sigilo fiscal do magistrado e apontou a suspeita de que ele foi “corrompido para favorecer indevidamente” uma advogada esposa de outro juiz “na obtenção indevida de mais de R$ 5 milhões”.

O desembargador revogou, “sem qualquer fundamentação concreta”, uma decisão que ele mesmo havia proferido, o que caracterizaria, segundo as circunstâncias do caso, um ato de corrupção, segundo a PF. Ainda a partir da investigação, a PF interceptou mensagens de envolvidos no esquema. Em um dos diálogos, um advogado alvo de mandado de busca e apreensão fala em “leilão” de magistrados.

A PF indica que as mensagens interceptadas estão relacionadas a um acórdão (decisão colegiada) em processo de embargos de declaração cível, cujo resultado foi de 3 votos a 2. A decisão teria sido proferida em 6 de abril de 2021. O advogado investigado, Félix Jayme Nunes da Cunha, diz na mesma data que esperava o resultado de um julgamento. Em conversa com um interlocutor, ele diz que estava ligado em um julgamento que teria início às 14h e que havia acabado de sair do Tribunal de Justiça.

“Vou faturar por 3×2 … Pqp leilão danado kkkk … Cada um quer mais que o outro (sic)”, diz trecho da mensagem.

Dois dias depois, este mesmo advogado envia outra mensagem a um servidor do TJ “confirmando o resultado e reforçando a compra da decisão”, segundo a PF. “Ontem eu terminei de pagar os caras lá”, escreveu em mensagem. Para a PF, há “fortes indícios” de que a decisão em questão foi “fruto de corrupção”.

Em nota, o advogado afirmou que os fatos estão distorcidos e não procedem, e que isso será demonstrado e comprovado no inquérito.

A PF cita outro trecho com indícios de possível negociação de decisão judicial. No diálogo, Félix conversa com um prefeito do interior que é seu cliente. “Ta barato prefeito. Vale”, escreveu. Em seguida, o político questiona se seria possível parcelar em duas vezes, ao que o advogado responde que não é possível porque haveria muita gente envolvida.

Outras ocorrências, em diferentes inquéritos, estão na mira da PF, incluindo uma investigação sobre servidores do STJ. A corporação apura ainda a possibilidade de venda de sentenças por integrantes de tribunais da Bahia, Tocantins, São Paulo e Mato Grosso.

 

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