4ª edição do Observatório da Educação Pública do Rio Grande do Sul revela situação do ensino no estado

No Rio Grande do Sul, 44% dos (as) jovens entre 15 e 29 anos trabalham e não estudam. Em 2023, 49 mil jovens gaúchos (as), entre 14 e 18 anos, estavam fora da escola e não haviam concluído o ensino médio. Já 38% ou 263 mil jovens, nessa mesma média de idade, ainda estavam frequentando o ensino fundamental. O número de matriculas na rede de ensino estadual caiu, em diversos níveis, como, por exemplo, no ensino médio em que foram de 300.024 em 2022 para 282.029 em 2023. 

Esse são alguns dos dados apresentados pela Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia, presidida pela deputada estadual Sofia Cavedon (PT), no lançamento da 4ª edição do Observatório da Educação Pública do Rio Grande do Sul. O evento aconteceu nesta segunda-feira (16), no Salão Júlio de Castilhos, na Assembleia Legislativa do RS. 

O documento é relativo ao ano de 2023, e reúne dados do ensino público gaúcho nos últimos anos. A publicação foi elaborada com dados de diferentes fontes oficiais como a Secretaria da Fazenda do Estado, Secretaria da Educação, Secretaria de Planejamento e Gestão, Ministério da Educação (MEC), Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre outras instituições.

“Nós nos preocupamos em globalizar e tornar transparente os dados, porque a educação é muito tratada pontualmente. É fácil enrolar a educação, educadores ou passar uma ideia pública de novidade, inovação, melhoria quando a gente pega um ou outro caso, uma novidade, uma situação piloto. Na comissão a gente se ocupa em escutar os casos individuais, mas nosso esforço tem sido sistemático de organizar e perceber as recorrências e perceber no tempo histórico da educação”, ressaltou Sofia.

Conforme pontua a parlamentar, o relatório desvela a situação com números oficiais, com números estudados e cotejados ao longo de 10 anos, e também transversalizados. “A gente procura aplicar e comparar. O que também nos revela o observatório são dados da escolarização da população e em especial onde está a nossa juventude que está longe da escola.”

Raio X da educação 

Segundo o observatório em todos os níveis e modalidades de ensino houve redução de alunos (as), com destaque para o ensino médio que reduziu em 6% (17.995 matrículas), na comparação com 2022, e na Educação de Jovens e Adultos (EJA) que perdeu 17,94% (7.175 alunos) em comparação com o ano anterior.

Ao Brasil de Fato RS, a deputada destacou que os dados do observatório desvelam a redução dos recursos aplicados na manutenção e desenvolvimento do ensino, ao longo do tempo. “Essa relação com a redução das matrículas, a desobrigação que o Estado faz, os índices baixíssimos de turno integral, de integração do médio com a educação profissional, o domínio quase absoluto da educação profissional privada, e também o descompromisso da grande maioria dos municípios com cumprimento das metas da educação infantil uma infância desprotegida.”

De acordo com Sofia, essa situação é agravada pelo movimento que o Estado faz de que os municípios assumam a sua responsabilidade com o ensino fundamental o que é, em sua avaliação um equívoco. “Tem que compartilhar essa responsabilidade, precisamos qualificar e ampliar tempo integral.” 

A parlamentar também ressaltou o achatamento do salário dos professores e professoras, a fragilização de vínculos com um percentual altíssimo de contratos temporários. “E aí é comparativo do estado do Rio Grande do Sul em relação às outras redes. Já passou, ultrapassou os funcionários de carreira. Tudo isso é o desenho da visão neoliberal da educação que Eduardo Leite impõe.”

Outro destaque do observatório é em relação às bibliotecas escolares. Conforme aponta o documento, o Executivo estadual, desde 2019, retirou os profissionais das bibliotecas, descumprindo a Lei Federal 12.244/2010, que estabelece a progressiva universalização das bibliotecas, com acervo e profissionais adequados. Atualmente o Estado tem 32 Analistas Bibliotecários e Bibliotecários efetivos, nenhum em escola.


Dados foram apresentados pela Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia / Foto: Raul Pereira

Necessidade de melhorias 

“Esse monitoramento nos mostra justamente a realidade das nossas escolas. É só chegar na escola aqui perto, no Paula Soares, que vai ver que precisa de demandas. Precisamos de uma atenção maior nos banheiros das nossas escolas, de atenção para a qualidade das nossas salas de aula. Todos esses dados de jovens saindo da escola reflete, primeiramente no que o jovem encontra dentro da escola. A gente precisa de melhorias e investimento na educação para gente conseguir trazer o jovem de volta para escola”, opinou a estudante Gabryele da Silva, integrante da União Gaúcha dos Estudantes (Uges)

Por sua vez a estudante Luiza Soares, integrante da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), pontuou que os dados são preocupantes, mas que a realidade pode ser mais grave, uma vez que não traz as sequelas da enchente de maio, destacando a evasão escolar. 

“A gente vê que a nossa educação pública está indo para uma vala cada vez mais funda. Estamos aqui para dizer basta. Dizer que nossas escolas, que a Árvore Livros* não nos basta como bibliotecas porque a gente tem um alto índice de estudantes sem acesso a internet. Precisamos dos livros físicos nas escolas. Defendemos uma escola de ensino integral que seja completamente pública e com assistência estudantil para que os estudantes não precisem sair da escola para ter que trabalhar.”

Para a professora Liliane Giordani, da Faculdade de Educação (Faced) da Universidade Federal do RS (UFRGS), os dados do observatório constituem um material importante e fundamental a ser trabalhado nas instituições. “É um material importantíssimo para os educadores e para toda comunidade que defende uma educação pública, plural e gratuita e democrática. Estaremos juntos nesse pleito para que a gente cumpra nosso papel como instituição federal de ensino na formação, mas também no movimento ativista em defesa da educação para que a gente consiga resistir, avançar e investir. Que a gente possa enfrentar pautas como aconteceu na Câmara de Vereadores semana passada da aprovação da lei da mordaça com força e rede.” 

O presidente da Associação de Mães e Pais pela Democracia, Júlio Sá, saudou o trabalho desenvolvido por Sofia na comissão, e lamentou que outros deputados ao invés de se preocupar com a educação, estejam preocupados com pautas como banheiro unissex e pseudo doutrinadores em escolas. “Os números demonstram uma situação tão caótica que a gente chega ao drama de ouvir relato de diretores de escolas que lamentam não terem sido atingidos por enchente porque assim teriam ganhado recurso federal. Esse documento é fundamental para que a luta não fique em dados genéricos. Estão aqui os números e a gente pode com isso enfrentar pontualmente um a um dos problemas”, ressaltou.  

“O observatório é um documento extremamente importante para auxiliar com informações corretas, informações que muitas vezes não são concedidas para os sindicatos, e nos auxilia para a gente poder fortalecer e fundamentar as nossas lutas”, ressalta o 2° vice-presidente do CPERS, Edson Garcia. 

Presente ao lançamento, o dirigente ressalta a situação dos jovens que estão fora do ambiente escolar. “Muitos jovens precisam sustentar suas casas, e muitas vezes não têm condições financeiras para poder bancar o transporte para ir para a escola. Esse é um problema. Outra coisa que chama atenção é a realidade ali dos alunos de raça negra, que são aqueles que, em sua maioria, não estão estudando, mas não estão estudando porque também, devido à falta de condições, devido à precariedade em termos de moradia, não têm condições de ir até a escola.”

De acordo com o observatório, 11,4% da população branca do RS de 15 a 29 anos nem estudava e nem trabalhava em 2023. Quanto às pessoas negras, 15,7% se enquadram neste perfil. Já entre as mulheres gaúchas, elas representam praticamente o dobro de pessoas que não têm ocupação e não estudam, em relação aos homens. “Há dados ali do observatório que nos chamam muito a atenção. Mas nada diferente daquilo que a gente já vem discutindo, denunciando há muito tempo, e que, no entanto, estar dentro do observatório faz toda a diferença”, conclui Garcia. 

Estiveram presentes na solenidade a deputada Luciana Genro (PSol), o deputado suplente Halley de Souza, o deputado Federal Elvino Bohn Gass (PT/RS), o ex-deputado Raul Pont, a ex-secretária de Educação, Lúcia Camini, a promotora pública Cristiane Corrales, e representantes de Universidades, Institutos Federais, da Defensoria Pública, OAB/RS, Umespa, da Associação de Orientadores e secretários de Educação municipais.  

O Brasil de Fato RS procurou a Secretaria Estadual de Educação para um posicionamento sobre os dados divulgados no observatório. Espaço seguirá aberto para manifestação. 

Abaixo alguns destaques do Observatório

Trabalhadores da Educação: 

• O reajuste de 3,62% incidiu para 70,8% dos inativos (66.350), mas 24.186 professores (as) inativos (as) não tiveram qualquer reajuste (o que corresponde a 25,8%) e 3,4% tiveram reajuste menor que 3,62% (3.229).

• A Parcela de Irredutibilidade, formada pelas vantagens temporais (triênios), foi novamente absorvida pelo reajuste. Ou seja, como ocorre desde a mudança no Plano de Carreira (2020), muitos(as) professores(as), especialmente inativos (as), não tiveram nada de reajuste no próprio subsídio ou tiveram menos de 3,62%.

• Há um achatamento na carreira (a diferença do nível I para o nível VI, que era de 100%, caiu para 30%. A diferença entre as classes, que era de 10%, caiu para em torno de 1%). As gratificações foram transformadas em parcelas fixas, que permanecem congeladas (Local de Exercício – Difícil Acesso; Docência Exclusiva; Atendimento a Pessoas com Deficiência).

• Depois de 10 anos, a retomada das promoções. Em outubro, deste ano, o Governo do Estado informou que serão retomadas as promoções do magistério estadual, indicando que a medida deverá ser adotada no primeiro semestre de 2025. As promoções estão paralisadas há uma década. As últimas promoções foram realizadas em 2014.

• Antes de 2023, o último concurso para professores(as) foi realizado em 2013. Na ocasião foram nomeados(as) 7.300 professores(as).

• Para servidores(as) de escola o último concurso foi em 2014: Agente Educacional I – técnico(a) em nutrição; agente educacional II – assistente financeiro(as), técnico (a) em informática, administração escolar, interação com o educando(a) e tradutor(a) e intérprete de língua de sinais/libras. Foram nomeados(as) 23.088 funcionários(as) de escolas, com criação de novos cargos e funções.

• Tomada inicialmente como política para suprir necessidades temporárias, os contratos emergenciais de professores(as) vêm se tornado uma das principais formas de ingresso na rede estadual do RS. Os(as) professores(as) contratados(as) não possuem estabilidade e consequentemente podem ser dispensados(as) a qualquer momento e principalmente são privados(as) de um dos principais direitos previstos pela CLT, o FGTS. Desde 2014, os servidores de escola tiveram apenas 6% de recomposição em 2022 (revisão geral), frente a uma inflação de 71,4% (INPC 01/2015 a 06/2024).

Matrículas Escolares

– Educação Básica 

• Comparando com o ano de 2022, a Rede Estadual de Ensino do Rio Grande do Sul registrou uma redução de 5% (38.672) alunos (as) matriculados(as) na Educação Básica em 2023.

Fonte: Censo Escolar (INEP/MEC) 2023 

– Educação Infantil

• 247 municípios gaúchos cumpriram a meta do Plano Nacional e Estadual de Educação de atendimento, no mínimo, de 50% de crianças de 0 a 3 anos matriculadas em instituições que atendem educação infantil. Isso significa 49,7% dos municípios. 250 municípios não atendem a meta. Isso significa 50,3% dos municípios.

• No que se refere ao atendimento em pré-escola (4 a 5 anos), que já deveria estar universalizado desde 2016, a meta não está atendida integralmente, pois 188 municípios não atingiram 100% de matrículas nessa faixa etária, representando 37,8%. 309 municípios cumpriram a meta (62,2%).

Em 2023:

• A rede privada respondeu por 32.5% do atendimento na educação infantil (151.921 alunos).

• A rede pública municipal respondeu por 67,2% do atendimento na educação infantil (313.637 alunos).

• A rede pública estadual respondeu por 0,3% do atendimento na educação infantil (1.170 alunos).

• Na zona urbana do RS temos 442.579 alunos matriculados e na zona rural 24.235.

– Evolução da matrícula por rede de ensino:

• Ensino Fundamental – Anos Iniciais caiu de 200.516 em 2022 para 196.823 em 2023.

• Ensino Fundamental – Anos Finais caiu de 217.896 em 2022 para 208.609 em 2023.

• Ensino Médio caiu de 300.024 em 2022 para 282.029 em 2023.

• Educação de Jovens e Adultos caiu de 39.995 em 2022 para 32.820 em 2023.

• Educação Profissional – Na educação profissional estadual a redução de matrículas foi de 2,7% (menos 1.031 matrículas), movimento contrário ao observado nas demais redes estaduais brasileiras, que conjuntamente registraram crescimento de 7,9%, ou seja, mais 67.347 matrículas.

• Educação Especial  caiu de 35.875 em 2022 para 35.852 em 2023.

• Educação Quilombola caiu de 668 em 2022 para 234 em 2023.

• Educação do Campo caiu de 44.674 em 2022 para 42.334 em 2023.

• Matrículas em Tempo Integral – Em 2023, na rede estadual de ensino, apenas 4,3% das matrículas no Ensino Médio são em tempo integral. Se contabilizarmos as demais redes públicas, o percentual chega a 6,54%.

Número de Escolas da Rede Estadual

• Os dados do Censo Escolar de 2023 mostram que o número de escolas da Rede Estadual do RS tem caído sistematicamente. Em 2023, foram registradas 2.345 escolas estaduais. Em 2018 eram 2.497, ou seja, uma redução de 152 escolas.

• Nesta redução de escolas, 84 estão localizadas no campo. Nos últimos 10 anos a redução foi de 226 escolas.

• No que se refere ao número de turmas, em 2022 existiam 36.597 turmas, enquanto em 2023 houve redução para 36.259, queda de 0,9% ou 338 turmas extintas.

O documento pode ser conferido neste link. 

* A Árvore Livros é uma plataforma que utiliza recursos típicos de jogos digitais para incentivar a prática da leitura. Voltada para instituições públicas e privadas, a iniciativa utiliza ferramentas tecnológicas com o objetivo de potencializar a Educação Básica e formar cada vez mais leitores no Brasil. Ao todo são mais de 11 mil escolas atendidas, contando com o suporte de 200 mil professores e beneficiando 2 milhões de alunos.

* Com informações da Assessoria de imprensa da deputada Sofia Cavedon.


Adicionar aos favoritos o Link permanente.