“Novo” Banco Central agora dirigido por homem de Lula estreia com os juros básicos sob pressão

A nova formação da diretoria do Banco Central (BC) terá um primeiro trimestre difícil no ano em que a instituição completará 60 anos de história. Sob nova presidência em 2025, a autoridade monetária enfrentará o desafio de diminuir incertezas sobre a nova composição do colegiado e já indicou que, até março, elevará a taxa Selic para 14,25% ao ano, o nível mais alto desde 2016.

Na última reunião de 2024, o Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a taxa básica de juros de 11,25% para 12,25% ao ano e sinalizou mais altas de 1 ponto percentual nas próximas duas reuniões, em janeiro e março. A avaliação do grupo é de que o cenário está mais adverso e menos incerto, por isso foi possível fazer o “guidance”, a sinalização dos passos futuros.

Para cumprir essa indicação, o Copom terá três novos membros e um novo presidente. Gabriel Galípolo, atual diretor de política monetária, assume a presidência. O economista Nilton David, que estava na tesouraria do Bradesco, ocupará a diretoria de política monetária. Gilneu Vivan e Izabela Correa, servidores de carreira, vão assumir as diretorias de regulação e supervisão de conduta, respectivamente. É a primeira troca de comando do BC desde que a instituição ganhou autonomia, em 2021.

A economista-chefe para América Latina do BNP Paribas e ex-diretora do BC, Fernanda Guardado, elogiou as indicações. Guardado lembrou que Vivan participa há muitos anos da primeira parte das reuniões do Copom, quando há uma exposição sobre o cenário econômico, e tem experiência em acompanhar o ciclo de crédito. A ex-diretora do BC também disse que David é um trader “superexperimentado” e que Correa tem uma carreira muito respeitada.

“Não podemos pré-julgar. O Gabriel [Galípolo] está há um ano e meio no Copom, aprendeu, tomou decisões difíceis já como parte do comitê, então acho que vamos ter que ver como esse comitê vai se comportar daqui para a frente. Há percepção bastante clara de que é uma situação complicada. Já há um guidance, então isso ajuda a diminuir um pouco a pressão desse novo comitê, principalmente para quem está chegando, nas próximas duas decisões”, afirmou a ex-diretora.

A economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Natalie Victal, pontua que sempre vai existir uma dúvida sobre como será o processo decisório de uma nova composição do comitê, mas ressalta que o BC continua com uma institucionalidade forte. “Claro que tem uma incerteza ainda quanto a como vai ser o processo decisório, que a gente só vai descobrir ao longo do caminho, mas os sinais que tivemos por enquanto são sinais que não desabonam nem um pouco a nova diretoria.”

O cenário que será enfrentado por essa diretoria é muito diferente do que estava desenhado no início de 2024. O ano começou com a Selic em 11,75% em um ciclo de quedas que terminou em junho. Em janeiro, o relatório Focus indicava que a Selilc fecharia o ano em 9%, com projeções de inflação em 3,87% para 2024 – acima da meta de 3%, mas dentro do intervalo de tolerância.

Segundo Guardado, do BNP Paribas, a atividade econômica em 2024 foi mais forte do que se esperava; o ciclo de crédito, mais expansivo; a política fiscal, mais expansionista, e ainda houve uma depreciação do real de cerca de 20% ao longo do ano. “A deterioração do cenário inflacionário ao longo do ano foi muito grande”, disse, mencionando que houve mais volatilidade em torno das decisões e da comunicação do BC.

Um dos momentos de volatilidade foi a reunião do Copom de maio, quando houve uma divisão no colegiado. Os cinco membros indicados pelo atual governo defenderam um corte de 0,5 ponto percentual, como havia sido sinalizado pelo colegiado na reunião anterior. Já Campos Neto e os quatro diretores que foram indicados pelo governo Jair Bolsonaro votaram pela redução de 0,25 ponto.

Os ativos reagiram com alta nos juros futuros de longo prazo, refletindo a percepção de maior sensibilidade do BC às pressões políticas no futuro. No dia seguinte, Galípolo explicou que a discussão foi mais sobre quanto se ganharia ao reduzir o ritmo de cortes contra o custo de abandonar a sinalização (“guidance”).

Alessandra Ribeiro, sócia e diretora de macroeconomia e análise setorial da Tendências Consultoria, disse que a divisão caiu mal no mercado porque já havia um “caldo” para isso, com críticas do presidente Lula e de membros do PT ao BC. “O caldo ainda continua, o mercado não precifica 100% de um BC completamente técnico e imune a esse tipo de pressão. O mercado vai ficar com esse pé atrás até ter evidência de que vai chegar a 2026, ano eleitoral, sem maior leniência do Banco Central. Ainda que tenha sim uma recuperação de credibilidade, o mercado ainda precifica um risco de maior leniência.”

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