Com juros e inflação voltando a subir e dólar na casa dos R$ 6, diminuem as expectativas de avanço mais forte do consumo de produtos e serviços nos próximos meses

O risco de que o cenário de forte instabilidade visto nas últimas semanas – com juros e inflação voltando a subir, e dólar na casa dos R$ 6 – afete o bolso e a confiança da população colocou em “banho-maria” as expectativas de avanço mais forte do consumo de produtos e serviços nos próximos meses.

Sustentados pelo ganho de renda e emprego, empresas e consultores de varejo, educação e saúde até continuam a sinalizar um otimismo moderado para o início de 2025. Mas fazem ressalvas por conta da deterioração recente do ambiente econômico.

Além de projetar alta contínua na taxa Selic – já se estima juros de 15% ao ano em meados de 2025 -, os orçamentos das companhias consideram uma perda de vigor do PIB (Produto Interno Bruto) e no ritmo de geração de empregos.

Não há também um novo “gatilho” de renda à vista que possa ser um fato gerador de novas expectativas, a ponto de transformar a atual dinâmica desses mercados. Em 2024, o governo chegou a antecipar a liberação de bilhões em precatórios e do abono do INSS para dar um novo fôlego ao mercado local. Só que, para 2025, pelo risco sobre as contas públicas, a antecipação não foi confirmada ainda.

“Para muitos negócios, vai pesar o fato de termos muitas variáveis negativas no começo de 2025, se movendo na mesma hora, o que torna difícil alguma estabilidade maior no mercado. E isso não ajuda o consumo em geral”, disse João Soares, analista do Citi, ao se referir à incerteza causada pelos ruídos no cenário fiscal, inflação e juros.

A deterioração do ambiente após novembro, e de maneira muito rápida, vem moldando o atual cenário.

No varejo, por exemplo, as vendas da Black Friday superaram as expectativas, com alta entre 8% e 19%, a depender do levantamento, e chegaram a reforçar a percepção de uma nova onda de aceleração na demanda. Porém, três semanas após a data, com a crise fiscal dando o tom de fim de ano, voltou o discurso de prudência para o primeiro semestre de 2025.

O economista da Confederação Nacional do Comércio, Serviços e Turismo (CNC), Fabio Bentes, projeta uma alta superior a 4% no faturamento do comércio em 2024. Em 12 meses até outubro, avança 4,8% e, para 2025, a estimativa é de crescimento de até 2%.

Em novembro, já era observado um movimento de negociação de reajuste de preços em alimentos, bebidas, itens de higiene, beleza, limpeza, e em eletrônicos e eletrodomésticos, na faixa de 5% a 10%, para repasses neste mês de janeiro. É algo em andamento, e contaminado pela escalada da moeda americana, por conta da crise de credibilidade enfrentada pelo atual governo.

No setor de ensino superior, o sentimento é de prudência nesse primeiro semestre, momento mais importante para as faculdades por conta do período de matrículas, diante de um ambiente de pressão da inflação e juros elevados que podem comprometer a renda do estudante com pagamento de dívida. Já no segundo semestre de 2024, o setor patinou. Mesmo com o aumento de renda e do emprego, não houve crescimento relevante no número de matrículas, inclusive em cursos de ensino a distância, cuja mensalidade média é de R$ 250.

Já no setor de saúde, há uma expectativa um pouco mais otimista para 2025, principalmente na comparação com os últimos três anos, quando as operadoras de convênio médico acumularam prejuízos de R$ 15 bilhões. Porém, não é todo o setor de saúde que respira aliviado. Para a Anahp, associação que reúne os maiores hospitais do país, o ano ainda vai ser de dificuldades, apesar de as operadoras de planos terem registrado lucro operacional de R$ 3 bilhões nos nove primeiros meses. “As operadoras melhoraram, mas isso ainda não se reflete para os hospitais, elas ainda nos pressionam”, disse Antonio Brito, diretor superintendente da Anahp.

Há um consenso de que as empresas de saúde – que fizeram dezenas de aquisições entre 2021 e 2022, com Selic abaixo de 5% – deverão adotar uma estratégia mais conservadora no atual cenário de juros com viés de alta. Em educação, as aquisições ocorrem praticamente no segmento de cursos de medicina, cujos “valuations” despencaram pela metade com a onda de judicialização que está colocando centenas de cursos no mercado.

No setor de consumo, as operações de fusões e aquisições perderam fôlego após 2022, quando o custo do capital disparou, pela necessidade de as empresas tocarem uma agenda de corte de despesas e renegociação de dívidas. E aquelas operações que ocorreram, foram em segmentos muito resilientes, como em moda premium (Arezzo e Soma) e “pets” (Cobasi e Petz).

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