Certificação da vitória de Donald Trump foi um teste para a democracia dos Estados Unidos, quatro anos após  a invasão do Capitólio 

Sentenciado e conduzido sob algemas em dezembro passado para cumprir um ano de cadeia, o norte-americano Philip Grillo fez rapidamente as contas: “Pouco mais de um mês e meio”. E deu de ombros, em alto e bom som: “Donald Trump vai me libertar assim que tomar posse como presidente.”

O simpatizante do líder republicano havia participado, em 6 de janeiro de 2021, da invasão do Capitólio, a sede do Congresso norte-americano, na capital Washington. Incitado por Trump, que jamais reconheceu a derrota para Joe Biden dois meses antes, o grupo participou da destruição da sede do Legislativo dos Estados Unidos, agrediu funcionários e parlamentares, dentre outras violações.

De acordo com relatório do Senado americano, sete pessoas morreram nos atos de violência. Os vândalos buscavam impedir, na marra, a diplomação do democrata pelos congressistas.

O mesmo Trump (que não participou do evento) esteve do outro lado do cenário, nessa segunda-feira, agora como vitorioso nas urnas. Após classificar, durante a campanha, o 6 de janeiro de 2021 como “um dia de amor”, ele recebeu a confirmação oficial de seu retorno, em uma cerimônia sem contestação por parte dos derrotados. Não houve incidentes.

A volta de Trump à Casa Branca, a partir de 20 de janeiro, é considerada por analistas políticos como uma reviravolta histórica que testará a democracia norte-americana. Polêmicas não faltarão. Basta mencionar que um de seus primeiros atos deve ser justamente o perdão a prisioneiros como Grillo.

“No ano passado ,os democratas tiveram tarefa duríssima: defender a democracia e nossas instituições, percebidas por boa parte do eleitorado como culpadas pelos últimos três anos de aumento de preços de alimentos, aluguéis e casa própria, além da entrada recorde de imigrantes sem documentação”, avalia o cientista político Jonathan Hanson, professor da Universidade de Michigan. “Fracassaram. Mas isso não significa que os derrotados de ontem devam baixar a guarda hoje. Ao contrário, a vigilância, tudo indica, precisa aumentar.”

Favorecido

O retorno de Trump ao comando da maior potência do planeta se confirmou após sua vitória nas urnas e no Colégio Eleitoral em novembro sobre a vice-presidente Kamala Harris. No papel de presidente do Senado, sua adversária deve comandar a cerimônia de hoje, em um retrato de democracia funcional.

Mas duas outras decisões também foram cruciais para o êxito de sua candidatura. A primeira foi a dos senadores republicanos, ainda em 2021, de não confirmarem o segundo impeachment do então presidente, fato inédito na História do país, votado pelos deputados uma semana antes do fim de seu primeiro mandato, por “incitar uma insurreição”.

A outra foi a da Suprema Corte, pouco antes da aclamação da candidatura do ex-presidente na Convenção Nacional Republicana, de confirmar “imunidade” futura a atos cometidos pelos chefes do Executivo. Inclusive o do primeiro presidente americano — no poder ou fora dele — condenado por um crime, o de suborno de uma ex-atriz pornô durante a campanha de 2016, antes de chegar pela primeira vez ao governo, para o qual receberá sentença no dia 10. Moldou-se, assim, o sistema ao líder de massas.

Em artigo inspirado para a rádio pública da Universidade de Boston, o veterano jornalista Glenn Rifkin, com passagens pelo “New York Times” e “Wall Street Journal”, denuncia o mesmo. O articulista buscou decifrar sinais do “dia de fúria indefensável” a partir do protagonismo de Trump há quatro anos e também agora.

Para os apoiadores do presidente eleito, argumenta, a ideia de que o 6 de Janeiro é sinônimo de turba, motim ou insurreição “agora desaparecerá de vez na obscuridade”, fruto “da imaginação progressista”. Ele enxerga no provável perdão aos que invadiram o Capitólio uma “anistia” que se transformará em “maldição para os que creem nos valores fundamentais de uma democracia”. (Com informações de “O Globo”)

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