Juíza do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro sofre ataque racista de advogado

A juíza Helenice Rangel, do Rio de Janeiro, foi alvo de racismo em uma petição encaminhada pelo advogado José Francisco Abud em um processo. Abud escreveu na petição trechos como “magistrada afrodescendente com resquícios de senzala e recalque ou memória celular dos açoites”.

No documento, o advogado também se refere a “decisões prevaricadoras proferidas por bonecas admoestadas das filhas das Sinhás das casas de engenho”. Abud já é investigado internamente pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

O juiz Leonardo Cajueiro Azevedo, a quem foi distribuído o processo do advogado após a juíza autodeclarar-se suspeita para atuar no caso devido ao ocorrido, oficiou ao Ministério Público, diretamente ao gabinete do Procurador-Geral de Justiça, para que seja instaurado procedimento criminal para apuração dos possíveis crimes de racismo, injúria racial e apologia ao nazismo.

A presidente da OAB-RJ, Ana Tereza Basilio, determinou à corregedoria da entidade a imediata abertura de investigação para apurar a conduta do advogado.

A juíza Helenice Rangel afirma que o advogado vinha se comportando de forma inadequada com e-mails debochados, irônicos e desrespeitosos, além de usar palavras de baixo calão dirigidas a magistrada e servidoras. “Sua conduta é ameaçadora. Temos que dar um basta a essa sensação de impunidade”, diz ela.

Em nota, o Tribunal de Justiça do RJ manifesta solidariedade à juíza e repudia as manifestações racistas do advogado, que “são incompatíveis com o respeito exigido nas relações institucionais e configuram evidente violação aos princípios éticos e legais que regem a atividade jurídica”.

“Tal comportamento, além de atingir diretamente a honra pessoal e profissional da magistrada, representa uma grave afronta à dignidade humana e ao exercício democrático da função jurisdicional”, afirma a nota do TJ.

O tribunal diz ter encaminhado o caso ao Ministério Público e à OAB para apuração rigorosa das responsabilidades nas esferas criminal e disciplinar.

A juíza Eunice Haddad, presidente da Amaerj, a Associação dos Magistrados do Estado do Rio, definiu o caso como “inaceitável”. “Racismo é crime e deve ser combatido por toda a sociedade. Desde o ocorrido, a Amaerj vem atuando em defesa da magistrada na adoção das medidas judiciais cabíveis”, diz a juíza.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também se manifestou sobre o caso:

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) repudia de forma veemente as manifestações racistas direcionadas à juíza Helenice Rangel, titular da 3ª Vara Cível de Campos dos Goytacazes do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) pelo advogado José Francisco Abud. Além de atingir diretamente a honra e a dignidade da magistrada, as ofensas afrontam o Poder Judiciário, que busca, de forma permanente, combater o racismo estrutural e reconhece que o povo negro foi escravizado e marginalizado ao longo da história brasileira.

Em 2022, o CNJ implementou o Pacto Nacional do Judiciário pela Equidade Racial que reúne uma série de medidas para combater e eliminar o racismo e todas as formas de discriminação no âmbito do Poder Judiciário. Além disso, no ano passado, aprovou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva Racial que oferece ferramentas para romper a naturalização histórica do racismo no sistema de Justiça brasileiro.

Desta forma, o CNJ reitera seu repúdio à ação conduzida pelo advogado, confia na apuração e responsabilização rápida e eficaz, além de reafirmar sua determinação em instituir ações afirmativas que resgatem uma dívida histórica de um povo que foi escravizado e sofre, até os dias de hoje, consequências de uma estrutura opressora, injusta e desigual.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.