Justiça do RS autorizou isolamento de preso morto dentro de cadeia 2 horas após ataque; detento havia pedido transferência


Jackson Peixoto Rodrigues foi baleado na Penitenciária Estadual de Canoas no sábado (23). Em carta escrita um dia antes, pediu transferência para outra cadeia por medo de ataque de uma organização criminosa rival. Homem tinha ligação com 29 homicídios, como mandante ou executor. Trecho de decisão que autoriza isolamento de preso morto na Pecan, em Canoas
Reprodução
A Justiça do Rio Grande do Sul havia autorizado o isolamento do preso Jackson Peixoto Rodrigues, o Nego Jackson, para preservar a segurança do detento na Penitenciária Estadual de Canoas (Pecan). A decisão judicial, no entanto, só foi emitida às 19h57 de sábado (23), cerca de duas horas depois de um ataque a tiros que vitimou Jackson, chefe de uma organização criminosa, dentro da cadeia.
📲 Acesse o canal do g1 RS no WhatsApp
A decisão judicial foi divulgada pela jornalista Rosane de Oliveira, do Grupo RBS, em GZH. O habeas corpus em favor de Jackson foi assinado pelo desembargador João Batista Marques Tovo.
De acordo com o Comando de Policiamento Metropolitano, o detento tinha ligação com 29 homicídios, como mandante ou executor.
Em posicionamento ao g1, o Tribunal de Justiça afirmou “que o referido pedido ingressou no plantão jurisdicional do TJRS às 18h30min do mesmo dia. Ou seja, em horário posterior à morte do apenado, circunstância que era desconhecida tanto pelo advogado quanto pelo Poder Judiciário”. Ainda segundo o TJRS, “o juízo recomendou à administração da casa prisional que adotasse as medidas necessárias para zelar pela segurança do apenado” (leia na íntegra abaixo).
Na decisão, o desembargador disse ser prudente a adoção de medidas de segurança para a custódia de Jackson. Ainda assim, Marques Tovo concedeu o habeas corpus para determinar que a direção da Pecan afastasse Jackson “do ambiente frequentado pela facção criminosa rival apontada” e, se fosse o caso, realizasse “o seu isolamento em cela de segurança a garantir proteção a sua integridade física”.
Habeas Corpus concedido duas horas depois da morte de preso na Penitenciária de Canoas
Na sexta-feira (22), Jackson havia escrito uma carta, endereçada ao diretor da Pecan, relatando temer “falhas de segurança”. Em terceira pessoa, o preso reclamava do fato de estar próximo de integrantes de uma organização criminosa rival.
“Solicita que seja dada uma atenção de extrema urgência, porque, como é sabido de todos, o requerente é inimigo histórico desse grupo. E, pelo fato de permanecer tão próximo e teme em haver alguma falha na segurança, pede que seja dada esta atenção”, disse Jackson na carta.
Jackson ainda disse, no documento, que era separado apenas por uma portinhola de outros apenados, inimigos da organização criminosa da qual fazia parte. Foi justamente através da portinhola que foram efetuados os disparos que atingiram o detento.
“O requerente só quer cumprir seu tempo de pena sem nenhuma alteração no percurso, porém não quer virar uma vitima do estado que está subestimando em colocar inimigos de grande rivalidade no mesmo espaço físico”, afirmou.
Trecho de carta escrita por preso morto em penitenciária de Canoas
Reprodução
O vice-governador Gabriel Souza (MDB) afirmou que ficou sabendo da existência da carta na segunda-feira (25). Com base nisso, o governo determinou o afastamento do servidor que teria recebido a carta – o diretor da Pecan e outros três servidores também foram afastados.
“De fato, houve um documento manuscrito pelo apenado entregue a um agente da Polícia Penal que está sendo afastado neste anúncio que faço agora (…). Essa carta teria sido entregue ao seu advogado, ao advogado do apenado. Portanto, é a informação que temos. Não conhecemos o teor da carta”, relatou Souza.
Em nota, os advogados de Jackson, Jader Santos e Cassyus Pontes, afirmaram que a transferência do preso da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) para a Pecan ocorreu no dia 19 de novembro, sem notificação prévia à defesa. Um dia depois, Jackson teria relatado à defesa que foi colocado na triagem junto de presos de outra facção.
A defesa disse ter relatado do risco que Jackson corria aos agentes penitenciários e que, no dia 21 de novembro, fez requerimentos administrativos e judiciais sobre o episódio. O preso escreveu a carta no dia 22 e, na madrugada de 23 de novembro, os advogados ingressaram com o pedido de habeas corpus.
“Jackson Peixoto Rodrigues não é apenas mais uma estatística. Sua morte é a evidência mais clara da falência de um sistema que, ao invés de protegê-lo, contribuiu ativamente para colocá-lo em risco”, disseram os advogados, em nota.
Jackson Peixoto Rodrigues, 41 anos, foi morto dentro de cadeia por outro detento
Divulgação/Polícia do Paraguai
Atendimento do Samu
A equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) levou cerca de uma hora até ser liberada para prestar socorro a Jackson na Pecan. De acordo com a Prefeitura de Canoas, a equipe do Samu foi acionada às 17h40 de sábado e chegou ao presídio às 17h55. O primeiro atendimento no local foi realizado às 18h50.
Jackson foi levado para o Hospital Nossa Senhora das Graças. Lá, deu entrada às 19h39, conforme o Executivo municipal. O preso morreu às 22h, após não resistir aos ferimentos dos tiros.
A prefeitura não informou o motivo da demora e sugeriu que isso só poderia ser esclarecido com a administração da penitenciária.
A Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo informou à RBS TV que o tempo decorrido entre a chegada do Samu ao complexo prisional e a realização do primeiro atendimento está sob investigação em um procedimento interno e que, por esta razão, não pode dar mais informações.
Penitenciária Estadual de Canoas (Pecan)
Omar Freitas/Agência RBS
Quem era o preso morto
O preso morto dentro da cadeia foi identificado como Jackson Peixoto Rodrigues, de 41 anos. “Nego Jackson”, como era conhecido, era apontado como chefe de uma organização criminosa do RS.
Conforme dados do Comando de Policiamento Metropolitano, Jackson tem ligação com 29 homicídios. São assassinatos, com decapitações e esquartejamentos, em que ele teria participação como mandante ou executor. A lista de antecedentes criminais do homem ainda inclui tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e associação criminosa.
Em 2017, “Nego Jackson” foi preso pela polícia do Paraguai. Ele foi capturado na cidade de Pedro Juan Caballero com outros três comparsas. Na ocasião, o chefe de polícia do RS declarou que o criminoso era o procurado número 1 do estado.
Jackson deu entrada no presídio federal de Porto Velho (RO) e pediu para ser recolhido no espaço destinado aos presos vinculados a uma organização criminosa do Rio de Janeiro. Conforme as investigações da época, ele tinha vínculo com um traficante de drogas que também estava preso no local.
Em 2020, Jackson foi transferido para o RS. O trâmite contou com escolta reforçada e aparato de segurança para a chegada dele no Aeroporto Salgado Filho. Do terminal, foi levado até a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc).
Preso morto em cadeia no RS pediu transferência um dia antes de ataque
Nota do Tribunal de Justiça
“Referente ao Habeas Corpus impetrado em favor de Jackson Peixoto Rodrigues, morto na Penitenciária Estadual de Canoas III, no último sábado, cabe esclarecer que o referido pedido ingressou no plantão jurisdicional do TJRS às 18h30min do mesmo dia. Ou seja, em horário posterior à morte do apenado, circunstância que era desconhecida tanto pelo advogado quanto pelo Poder Judiciário.
O HC questionava a decisão do plantão de 1º grau, que negou o pedido de remoção do detento para a PASC, por ser fim de semana, sem os devidos preparativos, considerando a alta periculosidade do apenado e desconhecendo detalhes da situação. Contudo, o juízo recomendou à administração da casa prisional que adotasse as medidas necessárias para zelar pela segurança do apenado, ficando a cargo do administrador do presídio dar eficiência à determinação judicial.
Essa decisão foi mantida pelo plantão do TJRS, que determinou, ainda, que o preso fosse afastado do ambiente frequentado pela facção criminosa rival e, se necessário, colocado em isolamento em cela de segurança que garantisse a proteção de sua integridade física, até decisão do juízo da execução criminal competente.
Apesar de todas as determinações do Poder Judiciário, que ordenaram medidas emergenciais de segurança adequadas à situação, não foi possível solucionar a questão, uma vez que os fatos já estavam consumados.”
VÍDEOS: Tudo sobre o RS

Adicionar aos favoritos o Link permanente.