Pesquisa revela alto número de assédio sexual e importunação contra mulheres corredoras

Pelo menos 85,5% das mulheres de Porto Alegre e outros municípios da região já deixaram de praticar a prática esportiva da corrida nas ruas por se sentirem inseguras nesses espaços. 48% dizem que já sofreram assédio sexual e 67% dizem que já sofreram importunação. É o que aponta uma pesquisa realizada pelo Movimento de Mulheres Corredoras.

O movimento se originou após comoção entre as mulheres corredoras, por conta de uma denúncia feita para o Brasil de Fato RS em julho de 2024, que revelou que quatro casos de importunação sexual foram registrados em menos de 48 horas por atletas que correm nos parques públicos de Porto Alegre, especialmente na Redenção e na Orla do Guaíba. A denúncia gerou comoção entre as mulheres corredoras e originou o Movimento de Mulheres Corredoras ─ que se propõe a ser um espaço contra a violência de gênero. 

A pesquisa teve seus resultados publicados traz dados de como se sentem as mulheres na prática do esporte. Segundo Aline Davila, articuladora do movimento, a pesquisa surge como meio de buscar organizar o que as mulheres, aparentemente, vivenciam isoladamente. “A violência sexual nas ruas é algo histórico, cultural e cotidiano. Quando esta violência atravessa os espaços de treinos das corredoras, é mais um viés desta brutal expressão social.”

Para ela, “o movimento das mulheres corredoras é um pedacinho de uma luta muito maior e com muitos recortes”. Aline afirma que “o movimento e a pesquisa existem como parte desta necessidade de tensionar as instituições a nos darem respostas”.

A pesquisa foi realizada em agosto de 2024, teve duração de um mês e contou com as respostas de 519 corredoras. A grande maioria delas é residente em Porto Alegre, porém cidades da região Metropolitana também foram abordadas, como Gravataí, Cachoeirinha, Canoas, Viamão, Eldorado do Sul, Alvorada. Ainda algumas de Campo Bom e Canela, que também fazem parte da região da Serra.

Perfil das mulheres corredoras

A grande maioria das entrevistadas tem de 26 a 40 anos e possui ensino superior completo, se considera heterossexual e quase 70% delas não têm filhos. Enquanto recorte de raça, 83% delas se consideram brancas.

Ainda na análise do perfil dessas mulheres, 77% das corredoras realizam seus treinos sozinhas, ou seja, não possuem uma assessoria de corrida ou alguém que as acompanhem durante os treinos. 92% delas treinam pelas ruas, parques, orlas e pistas públicas da cidade e não acham adequada a iluminação do local. Quase 90% delas menciona correr principalmente para melhorar sua saúde física e mental ─ e aí se encontra um paradoxo, pois o assédio e a importunação podem justamente colocar em risco a saúde física e mental dessas mulheres.

Outro dado alarmante revelado nessa pesquisa é que pelo menos 85,5% das mulheres já deixaram de correr por se sentirem inseguras nesses espaços e quase 70% delas considera que a iluminação desses espaços seja ruim para a prática do esporte. Em sua maioria, não se sentem seguras para correr sozinhas em parques. 48% delas dizem que já sofreram assédio sexual e esse número sobe para 67% quando perguntadas sobre importunação.

Chama a atenção também o número de mulheres que não fazem boletim de ocorrência, totalizando 96,9%. “A pesquisa revela a descrença com estas instituições, 56% das corredoras dizem não realizar BO por descrença na eficácia, e foi justamente com esta realidade que nos deparamos quando tomamos a decisão de realizar o BO e seguir com o processo junto aos órgãos. Não há respostas eficazes” pontua Aline.

Mobilização

Na época da denúncia, o movimento de mulheres corredoras lançou uma petição online que contou com mais de 15 mil assinaturas, reivindicando o patrulhamento efetivo dos órgãos públicos nos locais de treino, o funcionamento das câmeras de vigilância pública, a garantia de iluminação pública e campanhas públicas contra o assédio e a importunação sexual. Esse movimento, a partir da sua existência, propôs um trote coletivo que contou com mais de 100 corredoras e protocolou a um projeto de lei (PL 265/2024) em Porto Alegre, que institui a campanha publicitária de combate ao assédio e violência sexual contra mulheres em áreas públicas de prática de esportes.

Segundo Aline, a pesquisa revela de forma organizada os “medos, anseios e a triste experiência de ter que vivenciar tamanha violência.” Pontua que “96% das mulheres que respondera à pesquisa já vivenciaram o assédio e importunação sexual” e, ao mesmo tempo, que as mulheres seguem “treinando pelas ruas, ocupando os espaços públicos, apesar do medo”. 

O movimento tem o papel de ajudar a colocar na ordem do dia a violência que vem calando muitas de nós, o movimento nasce para ser mais uma voz coletiva nesta batalha”, reforça.

As participantes do movimento têm um encontro marcado no dia 22 de fevereiro para discutir os próximos passos.


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