Mais da metade do orçamento de Itaipu é de gasto desconhecido

A Usina hidrelétrica de Itaipu divulgou seu orçamento para 2025, revelando um dado que chamou a atenção de especialistas: mais da metade dos US$ 2,8 bilhões (R$ 15,8 bilhões, no câmbio atual) que compõem o custo dos serviços de eletricidade que os consumidores brasileiros e paraguaios pagarão está classificada sob a rubrica genérica de “outros”, sem detalhes sobre sua destinação e sem fiscalização de órgãos de controle externo.

O custo total dos itens orçados como “outros” soma US$ 1,58 bilhão (quase R$ 9 bilhões). Ao todo, esse item orçamentário sem especificação corresponde a 56,3% do montante pago majoritariamente pelos consumidores brasileiros. Deste montante, 78,85% serão bancados por brasileiros do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, já que o Paraguai não consome toda energia a que tem direito e, por regra do Tratado de Itaipu, o Brasil contrata a parcela que sobra.

Preocupações com falta de transparência

Segundo o documento, US$ 849,6 milhões foram alocados para a gestão brasileira da usina, conhecida como margem esquerda, e US$ 730,5 milhões para a gestão do Paraguai, chamada de margem direita. Especialistas afirmam que o alto valor destinado a uma categoria genérica e sem detalhamento dos gastos levanta preocupações sobre a falta de transparência na gestão da usina, que opera sem fiscalização direta de órgãos de controle brasileiros ou paraguaios, por se tratar de uma entidade binacional.

Na avaliação de Renato Morgado, gerente de programas da Transparência Internacional Brasil, os padrões de transparência de Itaipu deveriam ser equivalentes aos que as estatais brasileiras precisam seguir. Isso envolve a disponibilização de informações detalhadas sobre despesas, inclusive por parte de entidades públicas ou privadas que recebem repasses de recursos.

“O seu caráter de entidade binacional, o que acaba não submetendo Itaipu às obrigações definidas nas normas brasileiras de transparência, não é um impeditivo para que o governo brasileiro dialogue e negocie com o governo paraguaio o estabelecimento de padrões semelhantes. Se a melhoria da transparência de Itaipu já era necessária, fica ainda mais urgente no contexto atual de uso crescente de recursos da empresa em obras, eventos e projetos”, diz Morgado.

Dados da empresa mostram a crescente participação do item orçamentário sem especificação no faturamento da usina de Itaipu ao longo dos anos. Em 2016, essa categoria representava apenas 8,2% do total, mas passou por um aumento significativo a partir de 2022, chegando a 56,3% do faturamento em 2025.

Pietro Erber, membro do Instituto Nacional de Eficiência Energética (Inee) e do Comitê Permanente de Energia da Academia Nacional de Engenharia (ANE), lembra que, neste montante, há gastos como a revitalização da linha de transmissão, sob administração da /Furnas. Entretanto, os gastos pulverizados tornam difícil compreender a real destinação desses recursos e dificultam a avaliação sobre a eficiência desses investimentos.

“São projetos de interesse local, da vizinhança da usina do lado do Paraná e do Paraguai. É uma estradinha aqui, um mercadinho ali, uma escola municipal”, diz.

“Como pode o orçamento de uma empresa ter mais de 56% sem discriminação?”, questiona.

O que diz Itaipu Binacional

Em nota, a binacional disse que o Orçamento Econômico Global de 2025 segue a mesma estrutura dos anos anteriores e está de acordo com os normativos internos aprovados binacionalmente pelo conselho de administração da empresa. A usina acrescenta que a rubrica “outros” é composta por todos os gastos imputáveis à prestação dos serviços de eletricidade, incluindo os gastos diretos de operação e manutenção, seguros, gastos administrativos e de responsabilidade socioambiental.

“Os detalhes sobre a aplicação dos recursos estão disponibilizados nas Demonstrações Contábeis, revisadas por auditores independentes de forma binacional. A empresa de auditoria independente no Brasil é inscrita e regulada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM)”, disse. “Ressaltamos que neste montante de US$ 849 milhões está incluso o aporte que visa à modicidade tarifária, que em 2025 passará de US$ 300 milhões”, acrescenta.

A empresa disse, ainda, que visando a transparência, a margem brasileira de Itaipu divulga em seu site todas as informações sobre licitações, documentos oficiais, informações financeiras, entre outras coisas. Entretanto, há quase dois meses, a reportagem tenta, por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), obter dados sobre recursos financeiros transferidos pela Itaipu para a conta administrada pela Caixa Econômica Federal em 2023 e 2024, mas as estatais resistem em fornecer as informações.

Procurado, o Ministério de Minas e Energia (MME) não se manifestou. A empresa vem sendo pesadamente criticada por antigos diretores, ex-conselheiros, ex-diretores da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e parlamentares pelos gastos. Desde que assumiu a Itaipu, o diretor-geral brasileiro, Enio Verri (PT/PR), nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ampliou a área de influência da usina de 54 municípios para todos os 399 municípios do Paraná e outros 35 do Mato Grosso do Sul. As informações são do portal Valor Econômico.

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