Para reerguer a popularidade do governo, Lula foi aconselhado por seus marqueteiros a aparecer e falar mais

Para reerguer a popularidade do governo, em baixa nas pesquisas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi aconselhado por seus marqueteiros a aparecer e falar mais. A julgar pelas entrevistas e discursos mais recentes, a melhor forma de Lula atingir seu objetivo seria fazer o contrário e cultivar a discrição. As intervenções do presidente na área da economia têm sido divisivas, arranham a credibilidade do ministro da Fazenda e trazem custos, como a elevação dos juros futuros, que ditam o preço do dinheiro a consumidores e empresas.

Ao falar à Rádio Diário FM, de Macapá, Lula disse “ter certeza de que o [Gabriel] Galípolo vai consertar a taxa de juros neste País”, o que seria apenas questão de tempo. No dia 6, afirmara que a inflação dos alimentos foi causada pela alta do dólar e pela “atuação irresponsável do BC [Banco Central]”, que na gestão anterior armou uma “arapuca que a gente não pode desmontar de uma hora para outra”. Lula tem insistido em estabelecer uma clivagem entre o que foi o BC dirigido por Roberto Campos Neto, a quem fustigou o tempo todo por ter sido escolhido por Jair Bolsonaro, e o que será o BC em seu governo, com Gabriel Galípolo na presidência.

Galípolo fez a ponte entre Lula e o mercado financeiro durante a campanha eleitoral, participou da equipe de transição do governo e foi o número dois do Ministério da Fazenda, comandado por Fernando Haddad. Campos Neto teve trajetória parecida, mas no campo de Bolsonaro.

Lula tem várias implicâncias com o Banco Central e uma das principais é que não pode mandar na instituição. O BC ganhou autonomia formal, um arranjo sob o qual, com variações, convivem seus congêneres nos países desenvolvidos. Com o PT e aliados minoritários no Congresso, o governo não conseguiria mudar a situação e passou a criticar a política monetária, com consequências nefastas. Ao realçar o fosso entre a política monetária contracionista e a política fiscal expansionista, da predileção de Lula, os mercados passaram a considerar o então futuro dirigente da instituição, Galípolo, com a mesma desconfiança com que Lula via Campos Neto, ou seja, como um dirigente que aceitaria a ingerência do Planalto nos rumos da política monetária. Nada disso ocorreu até agora.

As declarações de apreço de Lula por Galípolo, além de não dizerem nada que possa mudar a percepção da população, têm o condão de aumentar a desconfiança nos mercados. O presidente vende a política do presidente do BC como se ela fosse muito diferente da de seu antecessor, como se Galípolo não tivesse participado por um ano como diretor de política monetária da instituição. Lula insinua que haveria uma orientação política distinta própria de Galípolo que ele ainda não teria podido manifestar, como a de, nas palavras de Lula, “consertar os juros”, isto é, reduzi-los bastante.

Galípolo fez uma explanação convencional sobre a atuação do BC para enfrentar a inflação, afirmando que o “remédio” dos juros altos vai funcionar e que a instituição mostrou que pode “colocar a taxa de juros em patamar restritivo e seguir nessa direção”. Não há qualquer indício de que os juros estejam fora do lugar e precisem de conserto, nas falas do presidente do BC. Por enquanto, as alocuções de Lula são mais a expressão de um desejo, sem base na realidade. Mas palavras de um presidente da República têm peso e elas ficarão na memória dos investidores, à espera de detectar um mínimo que seja que pareça ortodoxia de Galípolo e que possa reforçar uma suspeita ventilada por Lula. É um peso que Galípolo não precisaria carregar.

Lula e o PT foram contrários à independência do BC e ao sistema de metas de inflação. Ele gostaria de ter ascendência sobre a instituição. A última vez que isso ocorreu, com a presidente Dilma Rousseff, a inflação ultrapassou dois dígitos, acentuando um clima de crise que culminou na maior recessão em quase um século.

O presidente Lula deixou várias vezes ao relento o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em sua cruzada por alguma austeridade fiscal na atual gestão. Primeiro, desdenhou publicamente da necessidade de superávits fiscais. Em um de seus atos de maior consequência, incluiu em um pacote de ajuste fiscal, concebido para aplacar a desconfiança dos investidores sobre a trajetória do endividamento público, medidas que derrubarão as receitas (a isenção de IR para até cinco salários mínimos).

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